sexta-feira, 31 de março de 2017

A cultura da vida como resposta à lógica do descarte

Que sociedade queremos ou desejamos?

"Na Antiguidade clássica, nos lugares mais civilizados, a vida humana não tinha valor. Em Roma, só alguns homens tinham direitos, nem a mulher, nem os escravos eram considerados pessoas com direitos. O homicídio era uma prática comum: o pai podia mandar matar o próprio filho. Na Grécia, um bebé recém-nascido, com deficiência não recebia assistência até morrer; assim como os mais idosos. Quando nos vêm dizer que defender a eutanásia é uma questão progressista isso é falso. A ideia de que cada ser humano foi criado à imagem e semelhança de Deus, é uma verdade que fundou a Europa e a democracia. Isto é, diante da lei todos temos igual valor. Mas afinal qual é o limite da democracia? E o limite dos meus direitos, começando pelo direito à vida? E não é só o direito a não ser morto. O Estado social é um estado que apoia os mais frágeis, por isso todos temos que cuidar uns dos outros.
Porque consideram que a eutanásia é um debate civilizacional? Diante de alguém que pede para ser morto, o Estado diz: "sim, eu mato." E a seguir aparecem alguns médicos que assassinam o doente. Ou se, em vez disso, diante de uma pessoa que quer morrer  dermos uma resposta solidária? O drama de muitos familiares é conviverem com a doença de um ente querido, e sentem- se sozinhos, sem apoios sociais ou de cuidados paliativos, é um peso enorme e dramático. Quando se defende a eutanásia, diz-se que a tua vida não me interessa. Quem é contra a eutanásia, e pela defesa vida, aproxima-se do doente e não pede a sua morte. Mas para a lógica dos políticos uma pessoa em fim de vida não dá votos!
Por um lado, o Estado defende-nos, obriga-nos a usar um capacete, ou um cinto de segurança, para protegermos a vida, aplicando uma multa se não cumprimos, mas por outro lado aceita a eutanásia: surge aqui  uma grande contradição. A própria lei, atualmente, já toma decisões para proteger a nossa vida. Na Constituição Portuguesa a vida humana é um direito inviolável, é por isso, um direito fundamental, ninguém pode ser dispor da minha vida. É preciso desmontar a teoria da liberdade individual e o conceito de autonomia. O ante projeto do Bloco de Esquerda diz que para ser morto, são precisos três médicos, e se um deles não quiser, não matam o doente. Afinal onde está a autonomia? Sabemos que os médicos e enfermeiros podem ser pressionados. A eutanásia é um debate sobre que sociedade queremos? Uma sociedade onde a vida humana é relativa, em que os Estado diz quem deve ou não viver? Ou queremos continuar aprofundar este movimento de 2 000 anos, em que cada vida conta e tem importância, e usarmos todos os recursos para aliviar e não matar?
Vale a pena fazer um Referendo sobre a eutanásia? O que está a ser discutido é uma exceção de não penalizar o médico, mas na verdade o que está  em causa é o homicídio de vidas humanas."

José Maria Seabra Duque, jurista, discurso na Sessão sobre Eutanásia na Paróquia de Nossa Senhora do Amparo, Benfica, no dia 28/03/017

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